Talvez quem passasse pela sala da casa dos meus pais naquele dia, há pouco mais de um ano, não se desse conta da seriedade da nossa conversa. Até porque tinha leveza e respeito, que sempre nortearam meus bate-papos com meu avô. Na verdade com os dois, paterno e materno, mas conto agora um causo do pai da minha mãe.
Sentados, quase lado a lado, no sofá, ele me olhou nos olhos e disse que eu já tinha idade para lhe dar um bisneto. Eu sorri, no primeiro momento. Estava já me acostumando as cobranças. Sou a neta mais velha. Nasci 2,5 meses antes do primo homem mais velho. Depois vieram mais três primos, meu irmão, e só então duas meninas. Para fechar, a "rapinha do taxo", hoje um lindo moço mais alto do que eu.
Mas meu avô voltou a me encarar e sorriu. Seu sorriso era de "porque não?". Expliquei que não me sentia pronta. Que tinha outras ambições e que um filho me tiraria a liberdade. Não se eu estivesse mais perto, deve ter pensado. Porque no fundo nunca compreendeu porque eu escolhi estar longe de toda a família que mora ali, tão junto e tão perto. Porque tenho que deixar tanta saudade e preocupação quando volto para casa, a 450 quilômetros de distância deles?
"Vô, fica tranquilo. Quando chegar a hora você vai ser bisavô. Eu tenho certeza", eu lhe disse, quase interrompida por meu pai que emendou: "É Durigan. Desse mato não sai cachorro". Foi mais ou menos quando minha mãe também entrou na prosa. "Se depender dos seus netos a família termina aqui". Rimos um pouco, ele ficou pensativo, e todos voltamos para nossa "vidinha réia", como diria em sua sabedoria.
Final de fevereiro de 2007. Primeiro o susto, depois a alegria. Uma de minhas primas seria mãe. A família de adultos, enfim, teria uma criança. Meu avô vibrou. E levou as alianças ao altar no dia do casamento. Ele, não chorou. Se o fez ninguém percebeu. Choramos nós, ao vê-lo impecável naquele terno. Tão lindo! Sua pele tão branca e lisa. Seus olhos tão azuis. E a serenidade de quem tem toda uma história para contar.
Agora estávamos todos na expectativa. Bianca nasce em setembro. Nossa princesinha!
Mas ontem, enquanto eu almoçava, o recado de que meu irmão precisava falar comigo urgente me trouxe rápido à redação. O celular tocava insistentemente. Atendi. "Bia, já está na redação?" Respondi que sim. Mal desliguei o celular e já o atendi em meu ramal. E o celular voltou a tocar, era meu pai. Eu ali, com as duas linhas, to-tal-men-te ignorada. Os dois discutiam aos risos, mas entre si: "Pára pai. Não vai contar. Eu liguei primeiro". E meu pai, sempre tão brincalhão, resmungava do outro lado. Até que me irritei - claro que no mesmo clima de brincadeira: "O que está acontecendo, vocês não vão falar comigo?". "Tá bom, vou desligar Preta. O Bi te conta", disse meu pai, com voz radiante. Meu pai sempre fez assim. Nos instigava, mas deixava o gostinho da vitória para nós dois, meu irmão e eu.
"Bia, vamos ter mais criança na família". Por um instante pensei que estivesse falando com o futuro papai... mas a voz muito tranquila de minha mãe ao fundo: "Manda ela adivinhar de quem é..." colocou a hipótese fora de questão.
Mas eu acertei. Era do Giu e da Gê. Sai contando pra todo mundo do meu trabalho que seria tia de novo. É, tia. Filho de primo-irmão é sobrinho, não é? Melhor que seja porque eu e meu irmão já avisamos lá em casa que é melhor nossos pais curtirem bem o título tios-avôs...
Falei com meu primo, o futuro papai, e com minha madrinha, que agora seria avó. E foi ela quem me entregou o ouro. "O vô Durigan está numa alegria só!". Foi então que me lembrei da nossa conversa no sofá. Naquele momento em que eu lhe disse "... fica tranquilo. Quando chegar a hora você vai ser bisavô..." ele deve ter decidido. E não é que deu certo? Parece que vejo seu rosto, agora. Aquele sorriso maroto. Aqueles olhos azuis. E os pensamentos com o sotaque italiano herdado dos pais, já que nunca estivera fora do Brasil... "eles pensaram que eu não seria bisa...".
É, meu vô. Agora você é bi-bisavô. Parabéns!
A propósito, agora estou liberada, né? Então fui. Que a vida está acontecendo e não quero me atrasar.
Um beijo bem grande no seu coração, meu lindo avô de olhos azuis.