sábado, 4 de agosto de 2007

"Paris sous l´Occupation" (Jean-Paul Sartre)

Prometi que escreveria sobre Tête-à-tête, o livro que tem me mantido em companhia de Simone de Beauvoir, Jean-Paul Sartre e todos os que circundaram suas vidas. Aliás, o meio gosto que tenho pela leitura é individual, solitário. A outra metade, até egocêntrica, é o poder de compartilhar impressões, sensações e de fazer comparações.

Sobre o casal que dá vida à obra de Hazel Howley tenho muito e quase nada a dizer. A impressão é de que passaram a vida ensaiando o melhor jeito para que pudessem ter suas histórias contadas depois. Hazel concorda em partes com isso. O que não quer dizer que Beauvoir e Sartre não tenham vivido intensamente. Horas demais e horas de menos, ouso afirmar. Mas tudo é uma questão de ponto de vista.

No entanto, na vida, algo me chama a atenção ao mesmo tempo que me incomoda, aflige e afugenta. A "liberdade" vigiada e limitada. E vejo a guerra como a interpretação escancarada da impotência diante de um poder alheio. Ressalto, no entanto, que as batalhas interiores pelas quais passam os humanos mais ainda me amedrontam. Principalmente porque, na maioria das vezes, o alheio é o próprio eu. E o campo de batalha, ah, desse não há como fugir.

E é por isso que me chamou a atenção a maneira pela qual Beauvoir e Sartre olham para a "Paris sob a Ocupação" dos anos 40. Antes descrentes de que a guerra chegaria até eles - e muitas vezes, mesmo no "campo de batalha", Sartre parece estar ausente da situação, protegido por sua filosofia - agora os dois precisam deixar de lado suas incessantes buscas pela melhor interpretação das próprias vidas para simplesmente retratar o cenário que tinham ao redor. Sartre, que vivia à espreita de um novo olhar sobre as relações, agora precisa resgatar a França. E seus textos, ao mesmo tempo que mantém resquícios da muitas vezes abstrata filosofia, agora ganham corpo de retrato de uma página da história sob o olhar de quem estava lá.

"Perto da meia-noite, ouviam-se os retardatários correndo na rua para chegar em casa antes do toque de recolher, e depois reinava o silêncio. E sabíamos que os únicos passos ouvidos lá fora eram os deles. É difícil transmitir a impressão que essa cidade deserta podia dar, essa terra de ninguém colada em nossas janelas e que só eles habitavam. As casas nunca eram exatamente uma proteção. A Gestapo fazia com frequência suas prisões entre meia-noite e cinco da manhã. A cada momento, parecia que a porta podia ser aberta, deixando entrar uma rajada de ar frio, um pedaço de noite e três alemães afáveis com revólveres. Mesmo quando não falávamos sobre eles, mesmo quando não pensávamos neles, sua presença estava entre nós."
("Paris sous l´Occupation", de Jean-Paul Sartre)

"Era um mundo devastado", diz Beauvoir. "Nenhuma folha de grama em nenhum prado, por mais que eu olhasse, jamais voltaria a ser o que era."
(Simone de Beauvoir, em declarações posteriores, sobre quando Paris foi "libertada" e Londres recebia seus "primeiros mísseis balísticos de longo alcance")

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