segunda-feira, 30 de julho de 2007

"Galinha triste não põe ovos"

Quando essa brincadeira de blog começou eu queria fugir totalmente de tudo que me lembrasse trabalho. Era para ser como o meu irresponsável "diário verde", citado em "É chegada a hora...". Mas diante deste apetitoso exercício de parar alguns minutos para pensar no que escrever sobre meu dia, ou noite, e de que forma contar o(s) fato(s), sem compromissos ou regras, tenho me dado conta de quanto minha vida se alimenta do meu trabalho e vice-versa. "Você está virando uma workaholic incondicional", diriam, ou melhor, repetiriam alguns. "Pára de trabalhar e vamos aproveitar a festa, Rita", está gravado em uma das fitas da cobertura do festival de Cannes deste ano, com voz e rosto de um publicitário que virou amigo. Ok, galera! Tenho pensado no assunto. Mas não é disso que estou tratando agora.

Me dei conta de que este trabalho me permite conhecer, conversar, questionar e extrair o máximo de pessoas tão diversas quanto interessantes. Confesso que nem todas o são. Nestes casos faço o essencial. Mas tenho dado sorte. Encontrado pessoas que me fazem acreditar que o "amanhã melhor" está começando.

Afirmações tão simples como o título deste texto merecem ser repetidas. Não apenas porque saíram da boca de um bem-sucedido executivo. Mas porque as pessoas da empresa que ele comanda refletem, em sua maioria, a felicidade e tranquilidade em busca das quais se diz ocupar. E olha que lá eles também trabalham com deadlines e afins. Eu sei. Não é novidade pregar a satisfação como a "galinha dos ovos de ouro". Mas este é o exemplo mais recente que tenho. Por ter estado lá, vários dias, em horários diferentes e papeando com pessoas diferentes. Não acho que conseguiriam "manter a personagem encomendada pelo chefe" enquanto essa jornalista passeia entre uma sala e outra, sem avisar se está de chegada ou partida... Me soou sincero. Mais que isso, me pareceu real.

Vou ficando por aqui. Afinal, não me leve a mal mas ainda tenho "ovos para botar".

Tête-à-Tête

Os letreiros dos relógios ao longo da avenida se revezavam entre os 8ºC e as horas que se iam pelas 19h e seus minutos. O filme que eu e minha amiga queríamos ver já havia começado quando atingimos o abrigo quente e, digamos, bem "habitado", do HSBC Belas Artes... Cheiro do Ralo. Escolha precedida de curiosidade e incentivada por questões de trabalho, neste caso não menos prazerosas: Heitor Dhalia, o diretor do filme e da O2, é um dos entrevistados dela para a próxima edição da revista Propaganda, na qual nós duas trabalhamos. Mesmo diante disso, decidimos que trabalho seria conversa para a manhã do dia seguinte, a segunda-feira. Motivo, aliás, para desistirmos de esperar a sessão das 21h30.

Já diante da ansiedade da balconista, que nos serviria provavelmente um chá para que não fosse em vão nossa ida ao cinema, decidimos que o cremoso chocolate quente da livraria Cultura, no Conjunto Nacional, encerraria melhor nosso domingo. Mãos nos bolsos e corpos encolhidos para minimizar os efeitos do frio, lá fomos nós, caminhando pela avenida Paulista...

Disputávamos cada minuto em silêncio para falar ou para ouvir, cada uma a sua vez, do seu jeito. É mais ou menos assim que acontece entre a gente. E é assim que o assunto nunca tem ponto final. Algum dia, em algum lugar, vamos retomar a partir daquela vírgula ou reticências deixadas para trás porque algo mais curioso nos saltou à vista. Ou quem sabe revelar aquele segredo que só uma amiga de verdade é capaz de compreender que foi importante tê-lo mantido no mais absoluto sigilo.

Do tradicional chocolate já tinham bebido o último gole. Fui de submarino - bebida tão saborosa e quente quanto. E ali permanecemos discursando e discutindo e discordando e concordando sobre nossas vidas e relações, até que o som ambiente foi invadido por uma voz capaz de anunciar que nós duas - e toda a multidão que estava ao nosso redor - tínhamos 5 minutos para "evacuar a área" (não tão sério assim, óbvio).

Voltamos pela encantadora Paulista, cenário de meus sonhos de menina do interior que queria morar na capital só para poder andar assim, sem hora para voltar para casa, por aquela avenida que agora era toda minha.

Nos despedimos... mas até isso é muito difícil. Há delongas por um assunto pendente. Até que aquele garoto se aproximou e, com um simples olhar, percebemos que era hora de ir embora. Foi assim que nos despedimos, sem dizer ao menos uma palavra.

De um salto entrei e liguei o carro, mas o menino só queria dar sinal ao ônibus que, só depois, avistei no retrovisor. Agora era chegar em casa, tomar um banho quente e me entregar ao desejado livro ao qual não mais resisti, depois de meses de paquera naquela mesma prateleira da Fnac, onde eu e minha amiga nos encontramos horas antes. O livro? Tête-à-Tête. Li algumas dezenas de páginas antes de adormecer, suficiente para perceber que Hazel Rowley há de me proporcionar agradáveis momentos nas próximas noites frias, com sua obra e seus ilustres personagens: Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre.

Depois eu conto.

sábado, 28 de julho de 2007

Prece à plebe

Muito frio por aqui. Os dedos doem ao tocar o teclado. Mas não quero deixar em branco este espaço, com a lacuna de um dia. Não hoje. Então, vasculhei um dos meus devaneios passados, como farei vez ou outra, para postar aqui. E resgatar minha voz que gritou em silêncio nos rascunhos de outrora...
Ai vai...


"Dai-me mundo plebeu os sonhos dos ricos,
para que ao menos eu possa sonhar
enquanto eles riem e cospem seus sonhos
no mármore lapidado pelos meus
sob o qual pisam os sapatos
que os meus moldaram
e não herdaram.

Deixai ir a eles meu silêncio
porque os gritos já não alcançam
a surdez
dos que se escondem na pequenez
da alma.

Ouve-se mais minha guerra sem gritos,
sem tiros, gemidos.
Mais do que as tropas alemãs
e que o jazz erudito
ou o coro das igrejas
que mereja ouro
nas paredes onde o culto
joga a população ao oculto."
(escrito em 06/04/2000)

sexta-feira, 27 de julho de 2007

Ela sorria sim...

A manhã era fria. Já quase dez horas e o sol muito tímido não parecia suficientemente disposto a aquecer. Eu estava com o ar quente do carro ligado e bem agasalhada. Apressada, difícil não estar. Mas ao longe vi aquela garotinha correndo com sua trança e seu sobretudo bordô. Era de bons corte e tecido. Reduzi drasticamente a velocidade, incomodando a fila que se formava atrás de mim.

A garota? Uns quatro ou cinco anos, no máximo. Nos pés um sapatinho preto e a meia branca que não cobria toda a panturrilha, exposta ao vento frio e gelado. Mas ela parecia não se importar. Pensei no cobertor que deixei na minha cama quentinha antes de sair de casa.

Só o cabelo castanho claro, descuidadamente preso em uma trança, dava sinais de que a garota não era a herdeira de um daqueles carrões estacionados por ali, nos Jardins, bairro nobre de São Paulo. E sim da mendiga sentada uns 100 metros adiante.

Quando virou-se em minha direção, mesmo sem me ver, a menina chamou ainda mais minha atenção. Ela estava distraída com o senhor que, provavelmente tão encantado e assustado quanto eu, tirava do bolso bons trocados para recompensar aquele sorriso e aquela beleza. Ela sorria sim. Não para mim. Mas retribui o sorriso mesmo assim. Seus olhinhos eram amêndoas que brilhavam de felizes. Talvez porque sentisse frio... talvez porque tivesse um sobretudo bordô.

Um sorriso encantandor. Pintura que ganhava vida sorrateiramente enquanto os carros passavam, indiferentes, nas Alamedas, e as pessoas desfilavam suas grifes nas calçadas dos Jardins. Um anjo que sabe-se lá onde vai dormir nesta noite tão mais fria que a manhã que já passou... e com quem.

quinta-feira, 26 de julho de 2007

Sou católica, pero no mucho!

"Ah, católico todo mundo diz que é. Mas você frequenta missas aos domingos, por exemplo?", questionou um incrédulo colega de trabalho, certa vez. "Frequento", respondi, para espanto de meu interlocutor. No entanto, diante da afirmação de nosso Ilustríssimo Sr. Presidente, Luiz Inácio Lula da Silva - "Eu entrego minha sorte a Deus", referindo-se a quando entra em um avião - percebi que de nada adianta frequentar missa aos domingos se não tenho tamanha fé.

É isso, povo brasileiro. O segredo da sobrevivência - e com sucesso, diga-se de passagem - é ter fé. Dizem que cada povo tem o governante que merece... e que Deus é brasileiro. Só pode ser. Tá explicado. E não só é brasileiro como é petista. Aliás, alguém viu onde foi parar a estrela vermelha do peito do Cristo Redentor? Justo agora que está no foco como uma das 7 novas maravilhas do mundo... será que passaram a mão?

Se você encontrar, favor devolver. Faça como o presidente do Brasil: entregue para Deus.

Por falar em Trem da Alegria, alguém ai sabe onde anda o Juninho Bill? Aquele garotinho sardento que queria ser o presidente do Brasil?

Enquanto você procura eu vou pra casa tirar um cochilo.
Boa noite! E tenha fé... amanhã é um novo dia.

quarta-feira, 25 de julho de 2007

O que você faria?

O que você faria se acordasse pela manhã, para mais um dia de trabalho, e não reconhecesse seu corpo, sua voz... nem mais soubesse como se levantar da cama, aquela velha companheira que por anos a fio você simplesmente deu as costas sem nem ao menos dizer "até mais!"? Qualquer semelhança com "A Metamorfose", de Kafka, não é mera coincidência.

De início parece situação temerosa. Um desastre! Mas será? Deixemos a literatura de lado - e Kafka há de nos perdoar porque ele mesmo era avesso à tudo que não fosse a própria literatura, incluindo comentários sobre ela.

Você já se perguntou se é o que gostaria de ser? Se tem feito o que te faz bem? Qual o motivo de tamanha rejeição às mudanças? Ontem escrevi sobre o creme de papaia com cassis. Porque será que já nem me lembrava mais da última vez que saboreei a sobremesa que tanto me apetece?

Não sei. Dieta? Mas e os chocolates e sorvetes?!? Falta de opção? Não cola. Está sempre ali, em algum cantinho do cardápio: "Creme de Papaia com Cassis", normalmente seguido da descrição: "Delicioso creme de sorvete batido com mamão papaia coberto com licor de cassis". Só de pensar me enche a boca d`água...

Como não tenho a resposta, vou parar por aqui. Até porque ando avessa à auto-ajuda desmedida que se prega por ai. E esse texto caminha para isso. Bate na madeira 3 vezes e isola.

Mas eu acho que se você acordar amanhã e reconhecer seu próprio corpo, sua voz... tiver controle de seus movimentos... ainda dá tempo. Pense naquela sobremesa que você tanto gosta e há tanto não come. Se é tão bom, te dá prazer, porque não provar de novo? Só tenha parcimônia. Tudo que é demais sobra.

Bon apetit!

terça-feira, 24 de julho de 2007

Papaia com Cassis

Hoje não me bastaria fechar jornais e revistas ou desligar rádios e TVs para esquecer do desastre da TAM. Precisaria fechar os olhos, literalmente. Mas quando o táxi entrou na Washington Luiz e se aproximou do aeroporto, nem ao menos pisquei. A cabeça girava da esquerda para a direita e para a esquerda e para a direita enquanto eu tentava entender o que poderia ter ocorrido naquele curto espaço entre o barranco do aeroporto, tão ali, perto da avenida, e o prédio no qual o avião se chocou.

O táxi já ia longe e eu me lembro apenas de estar olhando para trás enquanto o taxista balbuciava algo que nem sei o que. E aquele cenário foi ficando distante, até que o perdi de vista.

Lembrei que tenho uma passagem da TAM com data em aberto para o interior de São Paulo, onde moram meus pais. Pensei na dor dos familiares... uma dor sem cura. "Mas eles nem sentiram dor", foi mais ou menos o que disse o taxista nesta hora. Quando consegui concatenar as idéias, percebi que ele se referia às vítimas mortas, não às vivas nas quais eu pensava.

A rádio noticiava que novas áreas para a construção de um aeroporto estavam sendo analisadas em São Paulo. "Deviam fazer em Santos, no mar. Como no Japão. Meu filho mora lá. Ele disse que é bom e não tem perigo", disse o orgulhoso taxista. Ufa! O foco foi de Congonhas ao Japão em poucas palavras. Aliviada, decidi fechar os olhos para o que ficara para trás e embarcar com o desconhecido em suas experiências familiares no oriente.

Cheguei à Churrascaria Rodeio quando, em pé, Washington Olivetto já discursava sobre sua anunciada aposentadoria daqui a 9 anos... seus sucessores na presidência da W/...

O dia frio e chuvoso continuou agitado. Entrevistas, reencontros com colegas que não via desde Cannes ou de outros eventos tão importantes capazes de reunir, como ali, a grande imprensa... e para fechar com chave de ouro um delicioso creme de papaia com cassis. Sobremesa que está entre as minhas preferidas, mas que, por algum motivo, há tempos eu não comia.

E a vida continua.
Pelo menos para nós que não estávamos há uma semana no Airbus A320 da TAM, vindo de Porto Alegre, nem naquele prédio da mesma cia aérea.

Sugestão de rodapé:
Caros governantes, talvez nos ajudem a esquecer ainda mais rápido as mazelas do nosso país se incluirem creme de papaia com cassis nas cestas básicas e merendas escolares.

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Teatro ou realidade?

Segunda-feira, 6h30 da "madrugada". Rodízio do meu carro. Chovia e eu não via muito além do parabrisa. De repente uma daquelas sombras negras - parece que todos os motoqueiros hoje usavam uma capa preta para se proteger da chuva torrencial - estava tão rente ao meu carro que me assustou. Mas logo se misturou às tantas outras manchas negras, garantindo-me a sensação de alívio. Não, não era um assalto. Só então me dei conta de que no caminho de casa até ali, uns 5 km percorridos, não pensei em outra coisa a não ser em o que escrever aqui.

"Pronto, vou escrever sobre os motoqueiros no trânsito de São Paulo... não, muito batido. Ah, mas tem o gancho daquele projeto do artista espanhol que deu câmeras para que alguns deles registrassem seu cotidiano..." O fato é que 2 km a frente estacionei na editora onde trabalho sem chegar a conclusão alguma. Pensei até que poderia comparar o motoqueiro que me fez voltar à realidade do trânsito com chuva, à um recurso da técnica do distanciamento, de Bertolt Brecht. Para quem não conhece, é a técnica usada no teatro para que o espectador seja um "crítico-social", lembrando a platéia que o que ela vê é encenação e não realidade. Mas meus pensamentos eram reais. O trânsito, a chuva... o motoqueiro... tudo era real. Calma, mudei de idéia.

Em minha mesa, escrevendo para a revista na qual trabalho, me comportei até que um amigo e colega de redação entrasse na sala. Desembestei a falar que ele tinha de ter um blog, que era jornalista...blá blá blá... Ops, ato falho. Eu? Que odiava que me cobrassem isso??? Hum, preocupante. Mas ele logo me convenceu de que tinha textos demais pra escrever para a revista, sem ter um blog. E me lembrou que eu também, com o agravante de ter meu blog.

Li e-mails, falei ao telefone, ao messenger, voltei ao trânsito para uma reunião. Mas dessa vez não tive a chance de devanear. Não tanto. O taxista não deixava. Queria me contar de tudo um pouco. Da "viagem ao redor do mundo" por Parati e Trindade, no Rio de Janeiro, e São Sebastião e Maresias em São Paulo. "Conhece menina?", perguntava. "Não, não conheço", respondi umas vezes. "Lá eu conheço sim", em outras. Silêncio... "E a tal da Paula (sic), menina. Você viu? A bandeirinha que anulou o gol do Corinthians? Parece que vai sair pelada na revista.", comentou ele. "Já saiu", respondi. "É mesmo, olha só. Tá ganhando dinheiro, hein", insistia.. "É", disse, quando me lembrei que ainda hoje teria de passar no banco. E a conversa se estendeu até o meu destino.

Reunião encerrada, hora de voltar para a redação. O segundo taxista me deixou escolher a rádio. Quer dizer, exigiu que eu escolhesse. Mas era uma "gentileza da casa". Pelo menos me deixou ouvir a rádio. Acho até que em certo momento se arrependeu de tamanha liberdade. Foi quando me olhou pelo retrovisor e eu me dei conta de que estava cantando, em médio e bom som, junto com o falecido Renato Russo. O que fazer em uma hora dessas? O que a Marta Suplicy aconselharia? Resolvi relaxar e... bom, continuar cantando (mais baixo, claro).

Voltei pra redação e continuei o trabalho, os bate-papos, os telefonemas, as reuniões, os e-mails... de repente um deles me chamou a atenção. A manchete do Adnews: "Mídia fará 1 minuto de silêncio em prol de tragédia aérea". "Caramba! Mídia em silêncio pra protestar? Isso não vai contra os princípios da imprensa?", pensei. Ai me lembrei das tantas vezes que fechei jornais e revistas nos últimos dias, ou passei direto por uma TV ligada, para fugir dessa insana busca midiática por mais sofrimento nesse trágico, porém "previsível", acidente da TAM. Claro que a dor dos vitimados importa. Mas à imprensa caberia mais cuidar para que se evitassem novas vítimas, quando esse acidente não for mais a bola da vez. Pronto, lá estava de novo o fantasma do Brecht e seu distanciamento a me assombrar. Mas agora que eu não sabia mesmo o que era teatro e o que era realidade.

domingo, 22 de julho de 2007

Paris nas telonas de São Paulo

Ontem assisti ao último - eu acho - dos três filmes em cartaz em São Paulo que se passam em Paris: "Paris, Te Amo". Os outros dois foram "Ratatouille" e "Medos Privados em Lugares Públicos". Recomendo os três.

Eu, que há menos de um mês estava na Cidade Luz, tive bons motivos para olhar para a telona e suspirar. Ah, Paris... Mas meus suspiros não eram solitários. Vários colegas de salas, cada um à sua maneira e com suas lembranças ou sonhos, reverenciavam as imagens e histórias que mostravam que Paris é mesmo tudo de bom.

"Ratatouille", a história do ratinho Remy que sonha em se tornar um cozinheiro famoso em Paris e se une ao orfão Linguini, encanta também pela animação. As cores, formas e personagens nos despem dos preconceitos de gente grande e nos permitem mergulhar na história feito crianças. Aliás, nesta sessão, as risadas sobressaíam-se aos suspiros - que ainda assim eram percebidos pelos ouvidos mais atentos. A moral da história também vale - e muito - para nossa sociedade imediatista que acaba por exigir que abandonemos nossos sonhos para podermos cumprir com afinco nossas tarefas.

"Medos Privados em Lugares Públicos", de Alain Resnais, aborda as relações humanas e seus conflitos. Que atire a primeira pedra quem nunca se encontrou em situação parecida - quiçá idêntica a ponto de pensar em processar o autor por ter escancarado parte de sua vida na tela do cinema, assim, sem autorização. Romance e humor, muito bem dosados, fazem parte da trama. Tão bem dosados como deveriam ser na vida real, mas "enfin"!
Há muita neve e, como aprendi no curso de teatro, todo objeto de cena deve ter sua razão de ser. No filme a neve tem. E como... Jamais poderá ser considerada excesso ou apelo emocional - pelo menos para mim. E o que é aquele elenco... nem vou me ater aos nomes que não é meu forte, fazer o que? Mas há expressões ali que mereceriam, no mínimo, 24 horas de observação com o DVD em pausa. Uma riqueza para os estudiosos ou amantes da interpretação. Meus aplausos... clapt, clapt, clapt...

"Paris, Te Amo". Uma colcha de retalhos em que cada pedacinho de pano reflete a visão de um cineasta sobre Paris - ou de uma dupla, como a brasileira formada por Walter Salles e Daniela Thomas. Gostei do drama social de nossos conterrâneos sobre a mãe que deixa o próprio filho em uma creche para... bom, não vou contar o final. Claro que há episódios alí sem pé nem cabeça. Aliás, em alguns só faltou mesmo personagens como a folclórica e brasileiríssima mula-sem-cabeça... rs. Bom, deixa pra lá. Isso se perde entre tantas outras boas histórias.
A que mais me tocou, entretanto, é a da turista americana, solteirona e solitária. Tomadas as devidas proporções, acho que o momento do ápice da cena, em que ela realmente descobre Paris e Paris a ela, aconteceu comigo. Algo como: sua felicidade não está em Paris ser o que é, mas em você, que está em Paris. Dá para entender? Se você assistir ao filme vai entender. Do seu jeito, mas vai.

Mesmo sem falar ou entender francês*, estas idas ao cinema me fizeram muito bem. Ouvir francês e rever Paris me alimentaram a alma. E me fizeram repetir intimamente a suave e não tão pouco poderosa expressão Paris, Je T´Aime. Por isso, nem eu mesma sei quantas vezes quero dizer Au revouir!

*preciso corrigir esta lacuna porque desde criancinha acho a língua mais linda do mundo. Certa vez, lá pelos 8 anos, talvez, encontrei nos "arquivos secretos" do sítio do meu avô materno um dicionário de francês. Velhinho, coitado - o dicionário, não meu avô... rs. Que hoje está em algum lugar dos meus "arquivos secretos", em Ibirá. O francês continua a me encantar. Mesmo sem entender além de um bonjour, s'il vous plait, ma-cherie, mon petit... merci - se é que é assim que se escreve. Mas vou aprender. Diminuir o afinco com que realizo certas tarefas menos importantes e dedicar-me ao francês... Ah, o francês... Promessa!

sábado, 21 de julho de 2007

É chegada a hora...

Eu já estava cansada de ser cobrada para que escrevesse um blog. "Jornalista sem blog?", questionavam uns. "É tão fácil fazer um", insistiam outros. Alto lá! É justamente porque sou jornalista e porque é tão fácil fazer um que fui deixando de lado, como tantas outras coisas na minha vida: o livro de poesias... o roteiro da peça de teatro... tudo no rascunho.

Mas inevitavelmente passei a conviver com pessoas e seus blogs. Em alguns momentos tive até raiva dessa tal de internet que faz a gente poder tudo - quase tudo, mas um quase que já é muito. Fui me rendendo aos poucos. Passei a ser visita frequente - e quase invisível - em alguns desses blogs. E no convívio com alguns de seus autores percebi que poderia ser prazerozo. Quase um exorcismo dessa angústia de não ter um livro, um blog, um filho... rs

Claro, como tudo em minha vida resolvi planejá-lo - o blog, não o filho. Tinha que ser perfeito e do jeitinho que eu queria. Diferente do dos outros. E como o universo sempre conspira a meu favor, eu até tinha a melhor data: 17/10/2007, dia em que entraria para o time das Balzaquianas. Ok! Estava decidido.

Mas eu fui percebendo que a vida não ia esperar até lá. Que nem eu mesma poderia garantir que chegaria aos 3.0. "Ai meu Deus! E agora?", pensei.

O despertador tocou e eu acordei essa manhã com vontade de escrever. Decidi: "é hoje". E foi.

Me lembrei do meu diário verde. Lá pelos 12 anos. Ele ainda existe. Guardado na casa dos meus pais. As vezes ainda o leio, no silêncio das minhas lembranças. É tão bom! Eu nem era jornalista, por isso é tão sincero. Tem alma. Tem vida.

Foi através dele, por exemplo, que meus pais descobriram que eu estava apaixonada pela primeira vez. O mesmo diário que hoje me transporta para um tempo que, acreditei, não passaria nunca. Passou.

Agora estou tentando ser sincera. O máximo possível. Mas é difícil. Uma professora muito especial um dia me explicou o porquê de dificuldades assim. Mais ou menos isso: "toda criança nasce com um luz muito forte dentro dela. Como é pequena, a luz tem ainda mais intensidade. Ai vai crescendo e aprendendo um monte de coisas que são jogadas lá dentro da alma. Sim e não. Pode, não pode. É, não é... A criança cresce e esquece que é preciso deixar a luz brilhar. Vai se enchendo de lixo e os raios da luz vão perdendo espaço, perdendo espaço... sobram ainda algumas frestinhas pra luz passar, até que o último raio se esconde. Mas ela me disse isso em um daqueles dias que estamos mesmo sem brilho, tristes e desanimados. Para finalizar, deu a sentença: "Rita, o bom é que você pode remover todo esse lixo ai de dentro. E sua luz vai voltar a brilhar. Ela não se apagou, só está escondida".

Lindo, não! Eu acho.

Ah, ontem também ouvi algo de uma pessoa muito especial que queria usar para finalizar este primeiro - e temeroso, confesso - texto: "Você é o que é naquele momento".