sexta-feira, 27 de julho de 2007

Ela sorria sim...

A manhã era fria. Já quase dez horas e o sol muito tímido não parecia suficientemente disposto a aquecer. Eu estava com o ar quente do carro ligado e bem agasalhada. Apressada, difícil não estar. Mas ao longe vi aquela garotinha correndo com sua trança e seu sobretudo bordô. Era de bons corte e tecido. Reduzi drasticamente a velocidade, incomodando a fila que se formava atrás de mim.

A garota? Uns quatro ou cinco anos, no máximo. Nos pés um sapatinho preto e a meia branca que não cobria toda a panturrilha, exposta ao vento frio e gelado. Mas ela parecia não se importar. Pensei no cobertor que deixei na minha cama quentinha antes de sair de casa.

Só o cabelo castanho claro, descuidadamente preso em uma trança, dava sinais de que a garota não era a herdeira de um daqueles carrões estacionados por ali, nos Jardins, bairro nobre de São Paulo. E sim da mendiga sentada uns 100 metros adiante.

Quando virou-se em minha direção, mesmo sem me ver, a menina chamou ainda mais minha atenção. Ela estava distraída com o senhor que, provavelmente tão encantado e assustado quanto eu, tirava do bolso bons trocados para recompensar aquele sorriso e aquela beleza. Ela sorria sim. Não para mim. Mas retribui o sorriso mesmo assim. Seus olhinhos eram amêndoas que brilhavam de felizes. Talvez porque sentisse frio... talvez porque tivesse um sobretudo bordô.

Um sorriso encantandor. Pintura que ganhava vida sorrateiramente enquanto os carros passavam, indiferentes, nas Alamedas, e as pessoas desfilavam suas grifes nas calçadas dos Jardins. Um anjo que sabe-se lá onde vai dormir nesta noite tão mais fria que a manhã que já passou... e com quem.

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